domingo, 17 de julho de 2011

Secretário estadual de Educação: 'Tem alguma coisa errada com nossa merenda'



Rio - Há oito meses no cargo, o secretário estadual de Educação, Wilson Risolia, 51 anos, exercita 14 horas por dia estratégias militares, inspiradas no livro ‘A Arte da Guerra’, de Sun Tzu, para comandar um exército de 1,25 milhão de alunos e 93 mil servidores em 1.462 escolas. O principal desafio é encontrar professores dispostos a reduzir a carência de 91 mil horários de aula sem professor, em disciplinas como Filosofia, Sociologia, Matemática, Física e Química.
No último concurso para Física, foram preenchidas só 20% das vagas. Com orçamento de R$ 3,6 bilhões para este ano, Risolia aumentou valor da hora-extra, concedeu auxílios-transporte, quitou débitos de 1998, acabou com a indicação política para diretores e diz que as metas já estão sendo atingidas.
ODIA: — O Rio quer estar entre os cinco primeiros do Ideb. Uma meta ambiciosa. Como chegar lá?

WILSON RISOLIA: — Projetamos uma meta para 2023, e sabemos onde queremos chegar daqui a 11 anos. O Rio está passando por um momento virtuoso, com a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas, em 2016. Cinco anos depois a economia ainda estará dinâmica. Temos que comparar a meta com a situação de cada escola. Vamos olhar para cada unidade. O Saerj retrata a situação de cada escola, com ou sem carências. Fizemos ajuste na meta. A cada dois meses medimos “temperatura e pressão” com o Saerjinho.
Como estão as metas?

Se fosse hoje, estaríamos dentro do programado para o bimestre. Mas é cedo. As famílias precisam participar. Faço esse apelo. A adesão foi de 80%, a melhor até hoje. Precisamos atingir 100%. Se a avaliação não for boa, temos ações corretivas, como reforço, formação continuada para professores, aceleração do ensino.
Qual é o déficit de professores na rede?

A carência é de 3.700 professores. Física é o maior problema. Fizemos concurso recentemente e não conseguimos suprir. Talvez consigamos atingir 20% da demanda na última seleção para Física. Em conversa com o Conselho Estadual de Educação soubemos que a Uerj tem apenas uma turma de Física, com 30 alunos. A academia não forma essa mão de obra. Temos outras situações crônicas como Filosofia, Sociologia e Ensino Religioso. Em Matemática, vamos zerar o déficit agora.
Como é possível resolver essa carência?

É complicado. Fizemos algumas ações que terão resultado agora. O retorno dos professores cedidos, reajustes das horas extras e da gratificação por difícil acesso. Quando se mede a carência em tempos, ao comparar fevereiro de 2010 com março de 2011, caiu 60%. Eram 229 mil tempos sem aula e, atualmente, são 91 mil. É muito tempo ainda: temos 3.960 em Filosofia, 3.704 em Sociologia, 2.793 em Matemática e 2.118 em Física. Acredito que vale a pena repensar na grade curricular para o Ensino Médio. Principalmente para atrair jovens que estudam na rede pública.
Há previsão de concurso no segundo semestre?

Vamos abrir 500 vagas para técnicos-administrativos, que vão liberar os professores para voltar à sala de aula. Estamos repensando a carga horária do professor 16 horas semanais.
Quantos professores estão cedidos hoje?

Cerca de 1.650. Nós conseguimos o retorno de 350 de um total de 2 mil cedidos. Estamos acolhendo esses profissionais para orientar sobre as novas funções que serão desempenhadas. Mas, em alguns casos, nos interessa que exista servidor da nossa pasta em funções importantes, como, por exemplo, secretário municipal de Educação.
Haverá reajuste?

Somos 93 mil funcionários ativos e mais de 70 mil inativos. É a maior categoria. Qualquer reajuste impacta na previdência. Pedimos ao Sepe (Sindicato Estadual de Professores) que pare a greve e aguarde o fim do semestre para verificar a arrecadação. Se fizer agora, corre o risco de não cumprir. Esse assunto está na minha pauta desde a primeira semana. Vamos avançar na questão financeira. Tudo custa muito: enquadramento, R$ 32 milhões; GLP foi R$ 17 milhões, dívida de 1998 com inativo de R$ 98 milhões. Nunca prometemos, mas estamos resolvendo. Só para infraestrutura são R$ 250 milhões em reforma, ampliação e construção de escolas.
Estudamos também, mas há dúvida jurídica se é possível fazer. Imagina pagar salários diferentes para docentes das mesmas matérias. Há hipótese de convênios com universidades e alunos de Engenharia. Pagaríamos uma bolsa para o jovem dar a aula, como estágio. E implantamos o programa de formação continuada, que financiará a segunda licenciatura para professores interessados.

Onde estão os maiores índices de reprovação?

A reprovação no 1º ano do Ensino Médio é muito alta. A passagem entre o 9º ano do Ensino Fundamental para o 1º do Médio é problemática no País. Se não existir uma sincronia entre municípios e estado, tem problema.

Hoje, temos alunos de 14 anos com outros de 60 na mesma sala do curso noturno. O senhor já sabe que não tem como dar certo. O que vai acontecer?

Quando começamos a discutir o futuro das escolas compartilhadas, percebemos que permitir a diferença de idade de 50 anos na mesma turma é problema muito maior do que mudá-las de endereço ou até mesmo fechá-las. Tudo isso ajuda o desempenho a ser pior. O prejuízo é para os dois.

Os cursos noturnos vão fechar?

Muitos cursos estão em escolas compartilhadas, as mais problemáticas, porque são da prefeitura e não podemos usar biblioteca ou esquentar comida. São 269 unidades que estamos investigando. Do total, 11 são só de 1º segmento (1º ao 5º ano) do Ensino Fundamental à noite. É possível que a gente feche só no fim do ano. Fatalmente essas turmas vão migrar para outras unidades. Mas não haverá fusão de turma, o que poderia gerar prejuízo pedagógico. É simplesmente tirar de um endereço e colocar em outro.

Com tantas mudanças em tão pouco tempo, como lida com a pressão de fora?

O livro ‘A arte da guerra’ diz que, se você se conhece e conhece seu opositor, tem 100% de chances de ganhar. Se você se conhece e não conhece o outro, tem 50%. Se não conhece ambos, vai perder. Não estamos na última categoria. Temos diagnóstico dos problemas e ações para solucioná-los. O desafio é fazer tudo sincronizado. Por isso, a greve é ruim. Por sorte, a adesão foi pequena.
Reportagem de Alessandra Horto e Maria Luisa Barros

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