domingo, 27 de novembro de 2011

Ser professor!

Eduardo Beltrão de Lucena Córdula
Professor, especialista em supervisão escolar




A educação no Brasil passa por um momento de extrema transformação. Desde os novos teóricos mundiais, com conceitos metodológicos que focalizam o lado humano e insere a pedagogia como processo científico na busca do entendimento das formas do ato de educar, transformando a criança no futuro cidadão, estamos por um lado, quebrando barreiras arcaicas do tradicionalismo que se reveste atualmente de dialógico e que persiste na bagagem metodológica de dogmáticos magísteres, e que acabarão, com o tempo, se convertendo à nova ideologia pedagógica, que vislumbra a gênese de novos paradigmas sócio-educativos em nossa nação. Porém, grandes são as dificuldades enfrentadas na educação pública, que não são previstas ou conjecturadas pela nova pedagogia, pois vivenciar tais situações é uma árdua tarefa unicamente nossa: professores/educadores do ensino fundamental básico, que, diariamente, convivemos com inúmeras adversidades ao processo de ensino-aprendizagem. Tais situações têm como gênese a comunidade, a família, o discente e a política nacional de uma maneira geral (Camêlo, entre outros, 2009).
Vemos e convivemos com situações das mais diversas ordens, indo de um simples desvio de comportamento refletido em sala de aula, por uma internalização de problemas oriundos do seio familiar ou da comunidade de origem de nosso alunado, até situações extremas de violência verbal e física exacerbada, de forma agressiva e explosiva de alguns de nossos alunos. Problemas cujas origens vão além do trabalho educacional e teriam que ter como participantes para saná-los outros setores sociais e políticos. Além disso, temos uma carência logística e humana de profissionais especialistas dentro das escolas para darem suporte às atividades docentes e, conjuntamente, buscar soluções e trabalhar com este alunado (Aranha, 2004).
Não obstante tudo o que já foi citado, temos a ausência das famílias de nossos alunos na escola, para que possam acompanhar o desenvolvimento educacional de seus(uas) filhos(as). Na realidade, muitos se omitem e, com isto, problemas que poderiam ser conjuntamente sanados passam a se repetir em um ciclo vicioso, pois só há um trabalho unilateral (pela escola) para solucioná-los. Percebemos que muitos desses familiares transferem a sua responsabilidade na educação doméstica dessas crianças para a escola, principalmente, para o(a) professor(a), cujo papel profissional não é este, porque vai muito além dos bons modos (Freire, 1997).
Nesta roda-viva da educação brasileira, cuja dedicação é formar brasileiros capazes de se engajarem na sociedade e se tornarem cidadãos comprometidos e responsáveis com o desenvolvimento da nação, contribuindo para o nosso crescimento e prosperidade, acabamos tendo que mudar a ótica do ensino para sanar problemas que nunca deveriam existir, mas programas e projetos são emanados de escalões superiores às escolas para serem desenvolvidos, baseados em estatísticas quantitativas, e o que mais nos interessa, que é o qualitativo humano, não é mensurado pelos modelos esquemáticos governamentais. Acreditam, portanto, que tais ações resolverão o déficit de aprendizagem e de qualidade na formação do indivíduo para a sociedade. Ao invés disso, o ensino da matriz curricular das séries acaba sendo desprezado para passar por um processo seletivo e se adequar ao desejo surreal de quem não vivencia nossa realidade, o que na essência não muda muito, pois a solução não está só na escola, mas em todo o sistema social e político que engrena a nossa sociedade (Fleuri, 1997).
Na ponta do processo está o(a) professor(a), mal remunerado(a), com longas jornadas de trabalho, sem o devido apoio político e social, sem valorização profissional e que vivencia todos os dias o árduo trabalho de ensinar e de educar as jovens mentes, amadurecendo-as cognitivamente, para que se tornem os cidadãos do amanhã. Apesar de tantas adversidades multifacetadas, revelamos o nosso lado não só profissional, mas também humano, de amor e de dedicação ao pleno ato de ensinar, enchendo crianças e jovens de esperanças, sonhos e preparando-as para um futuro. Mesmo com tantas barreiras e vieses que desestimulariam qualquer indivíduo, por mais competência que detenha em seu ser, mesmo assim, cansados e desestimulados, lá estaremos cuidando de nossas crianças, educando-as, escutando-as e tentando reverter o atual quadro de violência extrema e de desrespeito generalizado que toma conta de nossa sociedade globalizada, virtual e consumista (Sodre, 1998).
O primeiro passo está em compreender que cada criança possui um mundo próprio, com sua bagagem de emoções e de conhecimentos, oriunda de sua experimentação em família e em sua comunidade de origem, que claramente se refletem na escola. Temos que utilizar essa informação não para confrontar o alunado, mas para, a partir do seu mundo, transformá-lo e mostrá-lo um novo olhar sobre aquilo que ele está vivenciando, que poderá passar a ter outra conotação, um novo sentido para sua vida. Com isto, ele mesmo perceberá que caminho está tomando e mudanças acontecerão verdadeiramente (Camêlo entre outros, 2009).
Elevar a autoestima do alunado, tratando-o com respeito e dignidade, para que se sinta valorizado no processo de ensino-aprendizagem, exemplificando atitudes corteses e bons-modos que quebrantem a rígida carapaça arredia que trazem consigo e, mesmo que em alguns momentos se faça a necessidade de medidas repressivas, em virtude de comportamentos negativos extremistas, mostrar que a repreensão é necessária não como punição, mas como um momento de chamar sua atenção e de indicar que existem normas a serem seguidas, para que se mantenha o equilíbrio salutar entre todos na escola e na sala de aula e que, em nenhum momento, existirá o paradigma sentimental de raiva ou de mágoa, mas que sempre haverá a relação mútua de respeito e reciprocidade salutar entre professor(a) e aluno(a), até que todos entendam e fomentem em suas vidas a harmonia (Freire, 1990).
Alguns afirmam categoricamente que ensinar é um sacerdócio e não uma profissão. Mesmo com tantos problemas, é isto que torna a vida significativa, pois tão nobre ato de desprendimento pessoal é, em suma: ensinar, educar e cultivar vidas para que, em um futuro próximo, se tornem cidadãos com liberdade social e econômica e, neste momento altivo da vida, se lembrem de seu(ua) professor(a) da educação básica, que contribuiu para sua ascensão pessoal e profissional. E que, em retribuição, em sua jornada da vida, mudem a face da sociedade brasileira, para que valorize, prestigie e honre tão nobre profissional do magistério, como nos tempos de outrora.

BIBLIOGRAFIA

ARANHA, M. S. F. (Org.). Educação inclusiva, v. 3 – a escola. Coordenação geral SEESP/MEC. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2004.
CAMÊLO, I. A.; SILVA, J. V.; MANHÃES, E. V. S. Educar para a cidadania. In: I Seminário Regional de Educação Ambiental para o Semi-Árido Nordestino e Encontro Paraibano de Educação Ambiental, João Pessoa- PB, 2007. Anais. João Pessoa: UFPB/REAPB, 2007. CD-ROM.
FLEURI, R. M. Educar para quê? Contra o autoritarismo da relação pedagógica na escola. 9ª ed. São Paulo: Cortez, (Biblioteca de Educação, série I. Escola; v. 12 ). 1997.
FREIRE, P.; MACEDO, D. Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra. 3ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
FREIRE, P. Professora Sim, Tia Não: cartas a quem ousa ensinar. 8ª ed. São Paulo: Olho D’Água, 1997.
SODRÉ, M. G. Consumo e globalização. In: SÃO PAULO (Estado). Educação ambiental, meio ambiente e cidadania: reflexões e experiências. São Paulo: SMA/CEAM, 1998. p. 103-106.

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