sexta-feira, 13 de julho de 2012

O desafio de transformar gasto em qualidade
Educadores divergem sobre meta de 10% do PIB, mas concordam que é preciso melhorar a gestão dos recursos disponíveis
Mariana Timóteo
Manifestação da UNE, semana passada, por melhores condições na educação. Projeto aprovado na câmara prevê dobrar investimentos no setor
Givaldo Barbosa
SÃO PAULO . Aumentar investimentos na educação pública. Ampliar vagas em creches, equiparar a remuneração de professores à de outros profissionais com diploma superior, erradicar o analfabetismo, implantar o ensino integral em 50% das escolas públicas. Essas estão entre as 20 metas a serem cumpridas num prazo de 10 anos de acordo com o Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado na semana passada pela Câmara. O projeto, que ainda vai a plenário, prevê ainda um aumento considerável da parcela do PIB destinada ao setor: até 2022, 10% do total das riquezas geradas pelo país. Atualmente, o percentual é 5,1%. A perspectiva de dobrar o investimento no setor anima quem defende que isto é necessário para compensar o atraso educacional do país, mas gera também críticas de quem considera que a Câmara cedeu aos movimentos sociais de olho nas eleições. Para esses, a meta é inalcançável e o problema não é de dinheiro, mas sim de qualificação profissional e de falta de demanda social por educação de qualidade. Mesmo os defensores do plano afirmam que dobrar investimentos num setor marcado por problemas será um desafio, e que o governo precisará rever a forma como irá compor o Orçamento, que deve estar atento para que os custos não sejam repassados - em forma de impostos - à população já sobrecarregada. - Fomos os primeiros a calcular que o investimento na educação deveria ser de 10,4% do PIB, mas a sociedade precisa discutir, e pressionar, como isso será feito. Há muitos pontos ainda sem resposta, ou com respostas ruins e contraditórias - diz Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que cita como exemplo a "grande diferença" entre o que gastam a União (20%) e os estados e municípios (cerca de 30% cada) com a educação. - Desses 20% muito pouco vai para a educação de base, a maioria é para a universitária. A União precisa investir mais nas crianças e nos adultos que ainda não foram à escola. Em relação aos gastos de estados e municípios, este dinheiro precisa ser mais bem fiscalizado - completa. Priscila Cruz, do movimento Todos Pela Educação, alerta ainda para a qualidade do gasto. Os investimentos do Governo Federal com educação eram 3,9% do PIB em 2000, hoje são 5,1%. Baseada em dados colhidos do Prova Brasil e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), a organização calcula que, atualmente, apenas 11% dos alunos saem da escola com um aprendizado considerado bom em matemática - o mesmo índice de dez anos atrás. Em português, a taxa é um pouco melhor: 28%. - Mesmo assim, é muito baixo, demonstrando que só mais dinheiro não resolve. Outra coisa é o tema da evasão escolar: quase quatro milhões de crianças estão sem frequentar a escola. É um absurdo o PNE não ter uma meta para levar a criança de volta à instituição de ensino. O país gasta dinheiro demais com repetência e evasão - diz ela. - Aumentar o investimento em educação é importante, principalmente por parte do governo federal. Também ajuda saber que, com a queda da fecundidade, a população em idade escolar está diminuindo, o que ajuda no esforço de aumentar o investimento por criança. Mas precisamos discutir o que faremos com esse dinheiro. Hoje, o Brasil não tem feito bom uso dos recursos disponíveis - afirma o diretor-executivo da Fundação Lemann, Denis Mizne. Para ele, a prioridade no uso desses novos recursos que podem vir deveria ficar com a educação básica. Ele cita também como investimentos importantes o aumento da jornada escolar, especialmente em escolas que atendem alunos de baixa renda, e reformas no currículo, para que professores tenham mais clareza do que se espera que os alunos aprendam, além da melhoria da formação docente. O economista Gustavo Ioschpe diz acreditar que "com certeza" o atual orçamento atenderia às necessidades, se fosse melhor empregado. Ele lembra que 5% do PIB é igual à média empregada pelos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) como os europeus, a Coreia do Sul, o Japão, o Chile - que têm mais qualidade de ensino. Dobrar o investimento em educação, para ele, é totalmente irreal - e há o risco do PNE "virar letra morta". Se implementado, prejudicará ainda outras áreas da economia. - O país já sofre com um Estado paquidérmico, que consome quase 40% do PIB em impostos. Somar mais 5% a essa carga, quando o país já gasta o suficiente em educação, é uma insanidade. Se isso for cumprido, vamos perder mais dez anos lutando para realizar esse gasto, e aí talvez a sociedade perceba em 2022 o que todos os estudiosos do tema já sabem hoje: que mais dinheiro não comprará educação de qualidade. Quem dera o problema fosse tão simples - pondera o economista ( Colaborou Antônio Gois ).

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